Eva Schneider - Introdução



                Início do século XX.
            Fazia pouco tempo que ela morava nestas terras. Eram terras diferentes das de onde nasceu. Tudo era diferente e uma das coisas que ela mais sentia falta era a neve. Sua tia Matilda lhe disse que ali até nevava, mas nada parecido com a neve da Alemanha, de onde a menina havia chegado a menos de um ano.
            Eva agora morava em um lugar chamado Caeté, na Vila do Barracão, bem no sul do Brasil. As pessoas falavam uma língua estranha para ela, que sua tia dizia ser o brasileiro, mas ela sabia que, na verdade, poderia ser o português, a língua falada também em Portugal.  Ela sentia saudades de Heidelberg, na Alemanha, onde morou com o pai. A mãe Esther morreu quando ela nasceu e a menina só a conhecia pelas fotografias e pelas muitas histórias que seu pai contava. Histórias com tanta realidade que era como se ela sentisse sua mãe sempre por perto.  
            O pai, Friedrich, que era professor de História na Universidade de Heidelberg, subitamente adoeceu e ficou alguns meses na cama antes de falecer. Eva cuidava dele, enquanto ele, secretamente, sabendo que a sua vida estava se findando, organizava a ida da filha para o Brasil onde tinham parentes. Dias antes de falecer ele deu a filha um livro de capa marrom, mas com todas as folhas em branco. Eva guardou o presente e soube em seguida que era para preencher ele ao longo da vida com histórias de descobrimentos e aventuras.
            Após a morte do pai, sem nenhum parente vivo na Alemanha, Eva foi mandada para o Brasil ao cuidados do tio Albert, irmão de sua mãe. Ele era uma imigrante que tinha vindo da Pomerânia para morar no Brasil. A Pomerânia também era a terra de Esther, que se mudou para Heidelberg quando conheceu Friedrich. Eva não lembrava dos tios, eles haviam vindo para o Brasil há quase uma década, devido às necessidades que estavam enfrentando por lá, por escassez de terra e as constantes guerras que aconteciam na região. Os tios tinham um pedaço de terras às margens do rio Caeté e ali levavam uma vida tranquila, plantando de tudo um pouco, trocando produtos com outros colonos e ganhando dinheiro com a venda da farinha de seu engenho. Eles tinham um filho, já adulto, e que morava na colônia de São Pedro de Alcântara.

               
            A vida no Caeté era bem diferente da que Eva levava na Alemanha. Lá, ela vivia acompanhando o pai, lendo sobre antigas civilizações, sobre impérios distantes da Europa, sobre a vida selvagem que outrora se levava nas colônias portuguesas e espanholas. Era uma aluna aplicada, sonhava em ser professora um dia.
De uma hora para a outra, porém, se viu dentro de um navio, ela trouxe consigo alguns baús cheios de livros, a maioria de seu pai. Era como se, trazendo seus livros, ela trouxesse também uma parte dele com ela. Estava vindo em direção a um local repleto de mato, animais e até mesmo índios.
            Nos primeiros meses ela mal saia de dentro de casa e tinha dificuldades para conversar com os tios. O casal falava um dialeto alemão, o hunsrckisch que ela achava um pouco “caipira” pois era diferente do Alemão oficial falado em Heidelberg. 
            A escola da colônia ficava muito longe do Caeté e só ensinava até a 4º série do primário. Como na Alemanha Eva já estava na 6º série ela tinha que estudar em casa agora, até ter idade para ir estudar em uma cidade maior.

            O tempo foi passando e ela começou a perceber que estar ali naquelas terras pouco exploradas seria o mesmo que ir para dentro de um daqueles livros trazidos nos baús. Que ali havia todo um mundo de mistério e enigmas para descobrir. Que ela poderia ser uma desbravadora, conhecer aquelas matas, desvendar os mistérios, se tornar a aventureira que ela sonhava e viver as histórias para preencher o livro em branco dado por seu pai. 

Ilustrações: Hanahira Santos

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2 Comentários

  1. Parabéns Carol. Estou ansioso pelas histórias da Eva.

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  2. Wow, já vislumbro uma escritora na Academia Alfredense de Letras. Será a primeira ou já houve outras???

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