Para dar início a mais esse projeto, escolhemos
alguém que aos seus 85 anos certamente tem muita história para contar, Antônio
Luiz Martins, ou como é mais conhecido, o seu “Antônio Polícia”. Como ao lado
de um grande homem sempre existe uma grande mulher, quem o acompanha em seus
relatos é sua esposa Joana – 78 anos.
Antônio nasceu em Paulo Lopes, filho de Luiz
Antonio Martis e Maria Idalina da Conceição Martins. Aos 12 anos perdeu o pai e
mesmo sendo tão jovem assumiu o papel de homem da casa. Entrou para a Polícia
Militar de Santa Catarina, no dia 05 de outubro de 1954 trabalhando na cidade
de Florianópolis, logo se apaixonando pela profissão.
Avançando na carreira, foi transferido para a
cidade de Urubici, chegando lá no dia 30 de julho de 1955 em meio a um inverno
rigoroso. Ele recorda que quando estava chegando à cidade conheceu a neve, que
havia caído aos montes e deixava branquinha toda a Serra do Panelão. Foi uma
recepção e tanto! Ali ele teve uma prévia de como seria o inverno daquele ano,
um dos mais severos que já viu. Foi na cidade serrana que ele conheceu Joana
Rosa Martins, seu grande amor, companheira de toda a vida, mãe de seus filhos,
testemunha e parceira de tudo o que viveu até aqui.
Quando os novos
policiais chegaram à cidade, a notícia logo se espalhou: “A notícia correu e as gurias ficaram todas assanhadas”, contou
Antônio. Joana não estava na cidade quando eles chegaram, estava realizando um
batizado na comunidade de Rio do Tigre, pois ela sempre foi muito envolvida com
a religião e assuntos da comunidade, porém quando ela retornou as amigas Pedra,
Sebastiana e Lurdes contaram a ela a novidade.
Joana trabalhava
no hotel dos pais e o encontro com Antônio não demorou a acontecer. Eles
relembram como se fosse hoje o momento em que o olhar dos dois se cruzou pela
primeira vez. Joana conta que o jovem policial estava encostado no balcão do
bar do seu Nonoca quando ela passou em direção à cozinha e eles trocaram cumprimentos
cordeais de “bom dia”. Na volta ele já estava mais afastado do balcão e como
também havia ficado interessado na moça, se preparou para puxar assunto, mas a
primeira impressão de Joana era de que ele era um “gurizote”, pois como ela nos
falou “ele não tinha barba, bigode, nem
nada”. Contudo, apesar de parecer muito jovem, o moço era bem-apessoado,
sempre com sua farda muito bem alinhada. A conversa fluía bem, assim, logo um
se encantou pelo outro e começaram um namoro, que era bem diferente dos namoros
em tempos modernos; eles só podiam se ver se tivesse mais gente por perto, não
podiam pegar na mão e muito menos se beijar. Como o amor só crescia, logo
estavam preparando as coisas para o casório.
Eles casaram e foram morar em Águas Brancas, também
na cidade de Urubici. Foi lá que tiveram seus dois primeiros filhos, Luiz
Carlos Martins e Izete Terezinha Martins. Posteriormente, Antônio foi
transferido para a comunidade de Canoas, na cidade de Bom Retiro. A vida por lá
não era fácil, tinha um custo muito alto, então assim que soube da notícia de
que estavam montando um regimento na Colônia Militar de Santa Tereza, hoje
conhecida como Catuíra, o policial pediu transferência e no dia 03 de março de
1959 ele e a família foram morar na localidade que mais tarde faria parte da
nossa Alfredo Wagner.
O casal relembra com saudade o tempo em que viveram
em Santa Tereza, pois o local era tranquilo, com uma boa vizinhança, onde eles
criaram seus filhos. Aliás, foi lá que após algum tempo mais filhos nasceram: Izolete
Terezinha Martins e Antônio Carlos Martins.
A vida de
policial não era muito fácil naquele tempo, Antônio conta que existiam poucos
recursos. As diligências eram feitas de bicicleta, com cavalo emprestado ou a
pé. Muitas vezes ele carregou o preso na garupa da bicicleta para levá-lo até a
delegacia do Barracão. Outras vezes ele pegou cavalo emprestado para ir até
localidades mais distantes realizar prisões e quando precisava levar os
acusados até a cidade de Bom Retiro, quase sempre precisava ir para a beira da
estrada pegar carona com carros e caminhões que passavam subindo a serra. Nem
mesmo algemas eles tinham naquela época, mesmo assim o ex-policial conta com
orgulho que nunca precisou usar da violência para manter a ordem. Ele sempre
foi respeitado, onde quer que estivesse, e esse respeito fazia com que as
coisas se tornassem mais fáceis para ele, que apesar de não ter recursos,
cumpria com êxito suas obrigações, que eram muitas.
No ano de 1960, houve 14 assassinatos no município,
todos por briga. Antônio prendeu 13 assassinos em flagrante, entretanto ainda
lamenta não ter prendido o 14º, que foi o único assassino que fugiu naquele
ano. Tratava-se do acusado por um assassinato que aconteceu quando os dois
homens desciam de um ônibus vindo de Rio do Sul; o homem disparou contra a
vítima e correu para o mato, não sendo mais encontrado. Ele relembra que
algumas comunidades como Barro Branco, Alto Limeira e Barrinha tinham um alto
índice de violência e casos desse tipo eram comuns por lá, contudo não era
comum os assassinos ficarem impunes.
Após a
emancipação político administrativa, o distrito do Barracão se separou de Bom
Retiro e se transformou na cidade de Alfredo Wagner. Como não era mais
permitido ter destacamento em distritos, no dia 20 de março de 1964, Antônio e
a família se mudaram para o centro, indo viver no estreito, bairro em que moram
até hoje e foi lá que tiveram mais uma filha, Eliete Terezinha Martins. Dona
Joana recorda com saudade dos antigos vizinhos, lembrando o quanto tudo era
tranquilo e o quanto o espírito de fraternidade pairava no ar.
Quando vieram
morar no centro não tinha a igreja matriz nem o hospital. Eles viram tudo isso
ser construído, viram tudo de importante que aconteceu em nossa cidade desde
sua emancipação.
Foi morando na
cidade que uma figura passou a ser bastante conhecida da família, o Sony, nego
Sony como era conhecido. Eles conheceram o menino desde criança, sempre muito
levado e quando começou a crescer, passou a roubar, basicamente para comer e
passar bem. Antônio lembrou-se da vez em que ele roubou na venda do José de
Campos, outra em que roubou um porco no chiqueiro do Nino Barth. Ele conta que
Sony matou o porco e cortou em fatias bem fininhas, e como conta a história, de
fato assou ele na vela - mas não o porco inteiro - como contam para
impressionar.
Seu Antônio e Sony tiveram uma longa história
juntos, pois o policial o capturou muitas vezes. Antônio Polícia conta que Sony
tinha confiança nele, pois sabia que o amigo não iria maltratá-lo, apenas levá-lo
para a cadeia. Certa vez quando ele estava em busca do fugitivo, o mesmo foi
até a casa de Antônio e almoçou com Joana e os filhos. Quando chegou em casa, a
esposa contou que tinha dado comida ao velho conhecido. Antônio também lembra
que noutra vez trouxe o negro com as mãos amarradas com um cipó, pois naquela
época a polícia de Alfredo Wagner ainda não possuía algemas, ele foi encontrado
próximo à caverna que lhe servia de esconderijo, no morro do cemitério.
Antônio trabalhou
como Policial Militar até o ano de 1979 e depois foi trabalhar pela Polícia
Civil. Quando faltava delegado era o quebra galho e como Policial Civil também
contribuiu muito para a segurança da cidade.
A religião é
outro aspecto muito marcante na vida do casal, visto que a partir do ano de
1974 Antônio e Joana passaram a ser Ministros da Comunhão e posteriormente
Ministros do Batismo. Trabalharam muito tempo na igreja e em obras sociais,
ajudando as pessoas mais necessitadas da cidade, arrecadando roupas, alimentos,
remédios, ajudando a construir casas ou até mesmo, levando uma palavra de
acalento para quem precisava.
Foi com esse espírito
altruísta e de justiça que eles criaram a família da qual eles não escondem o
orgulho. Os cinco filhos biológicos, juntamente com a filha Cida foram criados
dentro desses conceitos e hoje enchem de felicidade o casal que nesse ano
completou 61 anos de casamento e faz questão de dizer que “sem nenhum arrependimento de nenhuma das partes”. Uma vida juntos,
sempre tendo a felicidade e a alegria como grandes companheiras. Foram anos de
muito trabalho e economia, mas que a cada dia mostram a recompensa. Uma das
maiores alegrias do casal é reunir a família toda, os filhos, os nove netos e
os seis bisnetos. “Não tem uma coisa que
deixe a gente mais feliz, a casa cheia, todo mundo conversando nas refeições, é
muito lindo ver a alegria deles, pois eles também gostam muito de se reunir”. Joana
também lembra: “Antigamente a gente ia
para a praia, a gente tinha uma caravan e ia cheia, todo mundo ficava junto,
era uma alegria só, aquele monte de crianças brincando, era muito bom”.
Tamanha é sua contribuição para a cidade que no ano
de 1976 seu “Antônio Polícia” recebeu o título de Cidadão Alfredense, mesmo não
sendo natural da cidade. Nem ele, nem Joana nasceram em Alfredo Wagner, mas
dizem que “foi essa cidade que nos
acolheu e é aqui que plantamos as nossas raízes e escrevemos a nossa história”.
1 Comentários
parabéns para sr. Antonio e dona Joana. Um Pedacinho de Alfredo Wagner.
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