Personalidade: José de Campos

Por: Carol Pereira
        Giovana Truppel
        Celita Irene Campos Angeloni

Data de nascimento: 23 de setembro de 1918.
Data de falecimento: 26 de agosto de 2006.

José de Campos amou a cidade de Alfredo Wagner-SC como um pai ama seu filho.
Homem honesto, empreendedor e, acima de tudo, com o olhar voltado para o futuro, foi por isso um visionário. Foi o maior benfeitor da nossa cidade. Entre suas ações, idealizou e foi o responsável pelo projeto de urbanização das ruas centrais tais como são hoje, e pela doação de inúmeros terrenos em área nobre da cidade.
José de Campos, também conhecido como “Seu Zé Campo”, filho de João Alexandre de Campos e Benta Emília Vieira de Campos, nasceu no dia 23 de setembro de 1918 em uma pequena comunidade agrícola, chamada Canto do Rio Gaspar, no interior de Vargem Grande, hoje distrito de Águas Mornas-SC. Nessa comunidade, ele passou sua infância e adolescência, frequentando a igreja e a catequese com devoção.
Na escola, por ser um garoto muito interessado e inteligente, conseguiu concluir todo o curso primário em apenas um ano. Como a vida era difícil, foi preciso que José parasse de frequentar a escola para ajudar os pais no serviço diário da roça. Mas, apesar de todas as dificuldades, não deixou de estudar. E, com a ajuda das três tias religiosas, irmãs de seu pai, ele conseguiu, através de correspondências que ele enviava a elas, completar os estudos do ginásio (correspondentes aos da 5ª a 8ª séries).
Foi também nessa comunidade que José frequentou suas primeiras festas e teve  namoradas. Como era de costume, o namoro da época era associado ao tempo e ao espaço: poucos domingos (de um a três domingos para decidir se o namoro era sério) e o caminho percorrido até a casa da namorada. Foi assim até que José conheceu Maria Zita Kuhnen, com quem se casou em 26 de junho de 1943. O casal morou com os pais de José por alguns meses. Em 1944, José foi à procura de um local adequado para a instalação de uma casa comercial que estivesse dentro do seu orçamento.
Estabeleceu-se, então, em Alfredo Wagner, em fevereiro de 1944, alugando de um morador o ponto comercial que desejava; e de outro, comprou o estoque de um comércio. Essa negociação custou caro, levando mais de três anos de trabalho: vendendo tecidos, ferragens e alimentos.  Trabalhou muito, junto com sua esposa, inclusive aos domingos, até que conseguiu pagar os empréstimos que fez para pagar o ponto, o estoque da loja e a aquisição de sua primeira casa. Essa casa (antiga pousada) ficava na Rua do Comércio, a principal da cidade, servia para sua residência e também para o ponto comercial, em cuja fachada havia a placa: “Casa Comercial José de Campos”.
Daquele momento em diante, os seus negócios começaram a prosperar e, no ano de 1953, José realizou outro bom negócio: trocou seu estabelecimento comercial e moradia por um caminhão e uma casa com grande extensão de terra próximo ao rio Caeté - com pasto, pomar, área para cultivar hortaliças e criar animais- aproximadamente 100.000 m², hoje centro da cidade.

    Acreditando no desenvolvimento de Alfredo Wagner, e demonstrando amor pela terra que escolheu para viver, ele idealizou o traçado das principais ruas e fez o loteamento de sua imensa propriedade em 116 lotes urbanos.
Na área mais importante de suas terras, fez doação de terrenos para: a construção do Colégio Silva Jardim, a Praça, a construção do Clube Social “Sociedade Recreativa União Clube” e as ruas - Rua Anitápolis, Rua Hercílio Luz, Rua Joé de Anchieta, Rua Arthêmio Rosa Farias, Rua Rui Barbosa, Rua 25 de Maio, Rua São João, Rua Florêncio Abreu e Rua Major Pedro Borges (ao todo, nove ruas).
Também indenizou em dinheiro, ou em troca de terrenos, aos proprietários cujos terrenos ou casas localizavam-se sobre o traçado das ruas. Foram indenizados: Jorge Fernandes, Pedro Quintino, João Aleixo, Quintino da Rosa (conforme suas memórias manuscritas, com as fac-símiles em  ANGELONI , 2007, p.145 e 146).
José também participou da equipe que idealizou e planejou essas construções; porém, as ruas ele realizou tudo sozinho (planejou, contratou topógrafo, contratou maquinista, contratou caçambas com macadame). Doou à cidade as ruas prontas para o trânsito.
Morando ainda próximo ao rio, começou a planejar e a construir a casa dos seus sonhos, na parte mais central das suas terras. Na segunda metade do ano de 1958, realizou a mudança para o sobrado com sua família. As linhas retas do sobrado marcavam o estilo moderno, prático e arrojado que, com localização privilegiada, passou a ser uma atração local, (a primeira com energia elétrica, com banheira e vaso sanitário). A família morou na casa por cerca de dez anos. A prefeitura municipal comprou a casa no ano de 1968. A construção existe até hoje e é usada atualmente como sede da Secretaria da Agricultura do município.
Nesta época, José também era dono do cinema da cidade. O cine Marajó ficava na Rua Hercílio Luz – onde hoje se localiza a igreja evangélica – e era um dos principais pontos de lazer para a comunidade. Foi ali que muitos namoros começaram. Além de exibir filmes, José também alugava o local para festas e confraternizações.
Morou em Alfredo Wagner durante trinta anos, com muita dedicação ao comércio local, à comunidade e às pessoas carentes. Aos pedintes, era rotina doar comidas, roupas e calçados. Todos os dias José e Maria Zita reservavam parte da refeição e uma sacada de frutas do pomar para distribuir aos necessitados. Eram pessoas do Caeté, da beira do rio, ciganos, andarilhos. Mais tarde, depois de aposentados, o casal passou a destinar parte do salário para a compra de dez cestas básicas mensais distribuídas entre os mais pobres da comunidade.
 José exerceu por vários anos a função de juiz de paz, a qual consistia em dar assistência às pessoas, conciliando-as diante dos conflitos existenciais. Ao saber de alguém com problema emocional, como depressão ou desânimo, José ia conversar incentivando a pessoa a enxergar a solução, a ver o seu problema do ponto de vista mais racional. Com isso, diminuía o sofrimento daquela pessoa que passava a ajudar-se, contornando a situação com relativa brevidade.
Com o tempo, essa prática foi-se incorporando aos costumes da cidade. E, de vez em quando, José era chamado a orientar quem dele precisasse. Atendeu José não só brigas de casais, mas de pais e filhos, de empregados e patrões, de vizinhos, de jovens, de namorados. E foram diversos casos: vinganças, brigas, tentativas de suicídio, ameaças, calúnias, a dor de perder um ente querido, namoradas grávidas abandonadas pelo namorado, entre outros. Interessava-se. Indagava os motivos de cada lado. “O namorado abandonou a moça  grávida? Onde ele está? Por que não quer mais a namorada?” José queria saber. Queria ajudar. Ia atrás do moço, às vezes até em outra cidade. Encontrava o namorado. Conversava. Convencia a respeito da responsabilidade para com o futuro das duas pessoas: a jovem e a criança que estava para nascer. Dizia que tinha que honrar o compromisso de ter iniciado uma família. A criança que estava para nascer precisava ter o pai ao seu lado.  E José conseguia.
Traçando objetivos cristãos, conseguia ser ouvido. Com bondade, com jeito, com carinho pelo ser humano, como quem só estivesse conversando. José convencia. Era uma figura que inspirava confiança.
José valorizava muito especialmente os estudos. E por valorizar os estudos, José incentivava sempre os filhos a gostarem. Considerava o caminho mais acertado para a garantia de uma vida melhor. Com os filhos estudados, percebia-se em José e Maria Zita, uma grande alegria por terem realizado esse sonho. José costumava dizer: ”Os estudos são a melhor herança”. Seus filhos se formaram em Odontologia, Letras, Pedagogia, Administração, Enfermagem. José preocupava-se com a falta de estudos de ensino médio na cidade. E, por isso, muitas vezes, procurava os pais desses jovens para incentivá-los a deixar os filhos estudarem fora da cidade. E até hoje pessoas reconhecem que tiveram a continuação dos estudos graças à motivação dada por José de Campos, que não tinha os olhos voltados só para a sua família, mas para os outros também. Por tudo isso pode-se dizer que expressam principalmente seus valores: o amor à família, o amor ao trabalho, o  amor ao próximo, e  em especial o amor aos pobres.       
Disposição era o que não lhe faltava nas áreas: política, pessoal e social.
Na área política, foi presidente do diretório da UDN do distrito de Catuíra, vereador, presidente da ARENA, duas vezes candidato à prefeitura ( sem sucesso).Participou da equipe que idealizou e planejou as construções importantes da cidade: Colégio Silva Jardim, Clube União, Casa Paroquial, Igreja, Hospital, Usina de Energia Elétrica. Junto dessa equipe também batalhou para a instalação de Paróquia da Igreja Católica e a elevação da Vila a Distrito e, por fim, a Município.
Na área pessoal, teve várias profissões: foi agricultor, boleeiro de carruagem, barbeiro, fotógrafo, pintor de paredes, transportador, dentista prático e protético, corretor de imóveis, farmacêutico e comerciante. Realizou-se em muitas áreas, sendo um empreendedor por vocação.
Na área social, durante sua trajetória, José teve suas ações sempre voltadas para o bem do próximo. Praticava a caridade diariamente com os menos favorecidos, fornecendo-lhes roupas, alimentos, remédios, e outras diversas ajudas, conforme a necessidade, fazendo inclusive doações de terras às pessoas carentes. Incentivava a todos o valor dos estudos. Muitos se admiravam dos seus esforços para os estudos dos filhos e dos incentivos para os outros jovens da cidade. A caridade, a bondade, a honestidade e a sabedoria foram as suas maiores qualidades. Participou da organização social da cidade, sendo ora Presidente da Sociedade União Clube, ora Presidente do time de futebol, o Sociedade Esportiva União Futebol Clube, ora fazendo parte como conselheiro da administração do Hospital e Maternidade, ora servindo de Juiz de paz.
 Era simples, mas de personalidade forte. Lia muito e estava sempre bem informado: um homem sábio, apesar do pouco estudo. Ele esforçava-se para saber além do que aprendeu na escola, quer pela leitura de jornais, revistas, e livros; quer pelo rádio e televisão.
Mesmo tendo passado por grandes dificuldades financeiras, José não perdeu a fé. Continuou firme em sua devoção católica, esperançoso de dias melhores. O que de fato conseguiu, por crer na benção de Deus, e por ser homem de pensar positivo. Pessoa de fé, testemunhou com ações, durante toda a vida, o seu amor a Deus e ao próximo. Tanto a família, quanto os que o conheceram , reconhecem nele um líder comunitário.       
Depois do golpe militar de 1964, houve uma crise econômica no país. E José, como dependia do comércio, sentiu grandes dificuldades. Começou a fazer empréstimos e, com os juros altos, foi enredando-se, complicando-se com dívidas  e inflação. O estoque ficou parado e as contas vinham para serem pagas. Também aconteceu de vender fiado, porque acreditava nas pessoas, via nelas o que via em si mesmo, não via maldade, não sabia dizer “Não”. Pediu concordata em 1967, levando dois penosos anos para pagar a todos . E ao grande  amigo Adelino Luckmann, seu maior credor, conseguiu saldar a dívida no decorrer de três anos adiante.
José criou até mesmo um estilo próprio: o costume de usar óculos escuros em lugares ao ar livre, um pequeno detalhe que o diferenciava da maioria.
Em 20 de fevereiro de 1974, mudou-se para a cidade vizinha, Bom Retiro - SC, por problemas políticos e financeiros.   Perdeu tudo. Recomeçou em Bom Retiro. Nessa nova terra, sentia a saudade do querido “Barracão”. E, sempre que podia, vinha dar um passeio em Alfredo Wagner-SC. Ficava feliz, e até emocionado! Podia-se perceber nele um amor muito grande pela cidade onde viveu os melhores anos de sua vida.
José obteve na cidade que o acolheu as condições necessárias para refazer sua vida. Solidificou-se de novo no comércio, reergueu-se, construiu nova morada. Suas virtudes e suas boas ações foram-se somando no decorrer de toda a sua vida, formando uma estrutura sólida, capaz de ajudá-lo nos reveses da vida, dando-lhe confiança para a superação dos problemas.
 Foi em Bom Retiro - SC que José passou por um enorme sofrimento, pois  perdeu seu grande amor: Maria Zita, mãe de seus dez filhos, em 19 de novembro de 1989, vítima de enfarte.
Depois de algum tempo, decidiu casar novamente, pois sentia o peso da solidão. Diante disso, os filhos aceitaram a decisão do pai, e ele se casou no dia 21 de setembro de 1991, com Maria Dolores Martendal. Os dois passaram a morar em Bom Retiro, por aproximadamente sete anos. Como a nova esposa não se adaptou às baixas temperaturas da região, mudaram-se para Santo Amaro da Imperatriz-SC.
José morou em Águas Mornas-SC ( Vargem  Grande) por vinte e cinco anos; em Alfredo Wagner-SC por trinta anos;  em Bom Retiro-SC por vinte e três anos; e em Santo Amaro da Imperatriz-SC por quase nove anos.
Estando acometido por uma pneumonia dupla e enfisema pulmonar crônico, José de Campos faleceu às vinte e uma horas e vinte minutos do dia 26 de agosto de 2006, aos 88 anos de idade, no SOS-Cárdio, em Florianópolis.
O legado pessoal que José de Campos deixou impresso mais profundamente foi a prática da caridade. Percebia-se que mesmo passando por dificuldades financeiras, ainda dava de si com generosidade e, por isso, foi um homem abençoado que deixou preciosas lições. Sabia realizar sua caridade de modo natural e espontâneo, não esperando nada em troca.
Além de contribuições à sociedade alfredense, deixou, também, admiração pelos exemplos de honestidade e de generosidade. José de Campos viveu com dignidade, combateu o bom combate, sendo um guerreiro diante dos sofrimentos advindos principalmente da política e das dificuldades financeiras. Enfrentou humilhações e incompreensões sem desanimar, porque era um homem de fé e sua força estava em Deus.
José de Campos foi um homem à frente do seu tempo, tanto nas ideias, quanto nas ações de progresso. José de Campos foi um farol a iluminar o futuro da cidade de Alfredo Wagner.
Biografia baseada na obra: Angeloni, Celita Irene Campos. José de Campos – Uma história para           Contar. Florianópolis: Ed. Secco, 2007.              
            

"José de Campos foi um farol...."

"Valeu a pena?
Tudo vale a pena,
Se a alma não é pequena."
(Fernando pessoa)


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3 Comentários

  1. Lembro de ouvir falar (bem) do Seu José. Meu avô, minha mãe e meus tios conheceram ele nos tempos do Barracão. Tive a felicidade de conhecer seus filhos e tive o privilégio de dar aulas para netos dele (Gui, Marina, Amanda).
    Parabéns a Celita, pela iniciativa de não deixar esmorecer a lembrança dele! Não somente seus jovens descendentes, mas a comunidade não deve jamais deixar de lembrar visionários como ele, que fizeram do nosso Barracão uma cidadezinha acolhedora e muito bonita!

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  2. Muito obrigada pelas boas palavras,Edson Osni Ramos.
    Uma história simples como era simples o viver no querido Barracão.
    Um abraço.
    Celita

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  3. Muito obrigada pelas boas palavras,Edson Osni Ramos.
    Uma história simples como era simples o viver no querido Barracão.
    Um abraço.
    Celita

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