Histórias da Nossa Gente – Elli Vand Sand Neuhaus



    Hoje vamos conhecer um pouco da história de vida de Dona Elli, que ninguém conhece como Elli e sim como a Mota, a mota da família Neuhaus. Como o “apelido” denuncia, Elli é descendente de alemães. Seus pais vieram da Alemanha e se conheceram no Maracujá. A família Neuhaus é muito influente no setor madeireiro e já há algumas décadas tem a cidade de Alfredo Wagner como sua terra. 

 

“Eu sou a Elli, tenho 82 anos. Moro em Alfredo Wagner”

 

            Dona Elli tem uma forte conexão com o Maracujá, comunidade que faz divisa com Alfredo Wagner e pertence ao município vizinho, Anitápolis. “Eu nasci no Maracujá e fui criada lá, fui pra aula, casei, tive meus 6 filhos, tudo no Maracujá”. 

Filha de Arnoldo Vand Sand e Emília Kleinjohann Vand Sand, Elli nasceu em 25 de agosto de 1939, sendo a filha mais nova dos oito filhos do casal - Pedro, Ana, Henrique, Gertrudes, Geraldo, Herna e Teia. Ela conta que seu pai veio muito jovem para o Brasil, com cerca de 18 anos. Ele atravessou o oceano sozinho, sem ninguém mais da sua família o acompanhando. O corajoso Arnoldo veio para tentar uma vida melhor em uma terra completamente desconhecida e naquele tempo ainda selvagem. Sua mãe fez o mesmo caminho com sua família, saindo da Westphalia, na Alemanha e quis o destino que os dois fossem parar no mesmo local, Maracujá. Foi lá que se conheceram “O casamento foi lá em Águas Mornas, foram de cavalo”

Ela relembra que seu pai tomava banho de rio todo dia de manhã cedo e depois que chegava da roça, não importando se fosse inverno ou verão: “Ele pegava a toalha, amarrava na frente e ia tomar banho todo dia de manhã, de noite também quando ele vinha. No inverno ia antes do sol. Ele dizia que a água era melhor, mais quente”.

Como Elli era a caçula da casa ela conta que não tinha irmãos mais novos para tomar conta, mas que ajudou a cuidar dos sobrinhos, que até hoje são como irmãos para ela “Tem sobrinho que é seis dias mais velho do que eu, então nós sempre brincávamos juntos”. Quando Dona Elli era jovem seus pais já eram de mais idade então ela também relembra que quando tinha alguma festa, um baile, ela sempre ia com a família de seu irmão. Era o irmão e a cunhada que tomavam conta dela e ela sempre tinha a companhia de seus sobrinhos, que eram quase da mesma idade. 

Seu pai gostava muito do Maracujá, ela conta que “Ele veio da Alemanha, foi morar ali e de lá foi pro cemitério. No mesmo lugar onde ele começou no mato, não saiu mais. Criou os filhos tudo e sempre dizia: daqui eu não saio, só quando eu morrer".  E foi mesmo o que aconteceu, seu Arnoldo morreu aos 83 anos, vivendo no mesmo local que comprou quando chegou da Alemanha, com apenas 18.

Ela tem muitas lembranças do pai: “Ele nunca tomou remédio, que eu me lembre. Morreu de enfarte, mesmo. Dançou comigo num casamento no dia anterior. Ele também gostava muito de cantar. Gostava de uma cerveja também, mas tinha pouca naquela época. Nunca tinha dançado comigo, naquele dia ele foi me tirar pra dançar, nós dançamos e ele estava tão feliz. Ele foi pra casa, e conversando com a mãe ele disse: "mãe, foi um dia tão feliz hoje, tão bom". Seu Arnoldo veio a falecer no dia seguinte, deixando dona Elli e toda a família com o peito cheio de saudade. 

Da escola ela lembra que só começou a estudar aos 10 anos de idade, pois a comunidade era um pouco isolada e antes não tinham professores que queriam ir trabalhar lá, pelo difícil acesso. Sua casa ficava mais ou menos há uma hora de caminhada da escola. Ela caminhava uma hora para ir e uma hora para voltar da aula. Ela recorda que começar a estudar foi muito difícil pois ela falava apenas em alemão, nunca tinha aprendido português, pois até mesmo seus pais falavam apenas a língua nativa da Alemanha. Ela só foi aprender a falar o “brasileiro”, como ela diz, quando começou a ir pra aula e as represálias contra os alemães se intensificaram no sul do país, mas seu pai era contra, não queria que os filhos falassem em português. 

Ela chegava da escola e como diz, “já ia direto pra enxada”. Na roça plantavam feijão, milho, batata, aipim. A família também tinha vacas de leite, para o leite e o queijo. “Mas não era que nem hoje, que fazem três, quatro tipos de comida. Feijão era feijão, puro. Aipim, arroz era mais difícil porque tinha que socar no socador, o pilão. Naquela época, não tinha arroz pra comprar assim quando eu era criança, depois quando eu casei já era diferente, mas mesmo assim, foi bem complicado”.

            Ela conta que conheceu o seu marido em uma festa que teve no Maracujá, mas que eles eram conhecidos de toda uma vida, “nós até fomos juntos pra aula, eles moravam no Maracujá, daí ele foi de muda com o pai dele lá pra Ilha Grande, depois foram morar lá pra Três Barras”.

            Ela ficou alguns anos sem ter notícias de Lino. Mas o moço tinha uma sapataria, em sociedade com seu primo Teobaldo Marian.

Lino foi para a festa com seus tios. Ela relembra que ele e os tios chegaram a pé, caminharam pelos campos e foi então que os dois se reaproximaram e começaram a se ver, começaram a namorar. 

            Mas dona Elli a princípio não queria nada com seu Linho “Eu disse: pois tu tem uma namorada no Caeté e ele me respondeu: não, mas eu vou deixar dela, não quero mais ela". E foi isso que ele fez, terminou com a moça do Caeté e iniciou o namoro com a amiga de infância. 

            Não demorou muito para Lino vender a sapataria e ir de muda novamente para o Maracujá. Foi morar com seu tio, para ficar mais perto da amada. 

            Ela conta que naquela época os namoros eram muito diferentes dos de hoje em dia. Quando Manu pergunta a ela “Não podia beijar na boca, né?” a resposta foi espontânea: “Deus o livre!!! Não podia se beijar de jeito nenhum, né, muito menos na frente dos pais”. Até mesmo pegar na mão, só era aceitável depois de um certo tempo de namoro, como ela diz: “nos primeiros tempos cada um pra si”, sem se tocar. Quando começaram o namoro Elli tinha 18 anos e seu Lino 21 e ela aguardava ansiosa pelo domingo, pois era o dia em que ela via o namorado.

            Quando se casaram eles foram morar com os pais de Elli, para que ela pudesse cuidar de seu pai, que nessa época já era bem velhinho. Eles moraram por oito anos com eles. Foi lá que tiveram os três primeiros filhos. 

Só se mudaram, pois, Lino tinha uma serraria com os sócios Leo Fe Gerônimo Wombemell e se mudaram para mais perto do trabalho do marido. Mas mesmo se mudando, Elli ainda ia toda semana até a casa da mãe, para fazer pão e ajudá-la no que fosse preciso.

O casal Lino e Elli teve seis filhos: Valdeni Neuhaus, Isolde Neuhaus, Denise Neuhaus (Nina), Orli Neuhaus, Waldir Neuhaus e Claudinei Neuhaus. 

Ela também nos conta que o filho Valdeni era muito apegado aos avós e que havia ficado morando na casa com eles, para ajudá-los. Quando o pai de Elli faleceu, Valdeni e a mãe dela também foram morar com eles na casa perto da serraria. Sempre foi desejo da mãe morar com a filha caçula quando ficasse mais velha – Dona Emília morreu aos 94 anos de idade. 

            Enquanto o marido trabalhava na serraria ela ficava em casa, criando os filhos e fazendo a roça. “Plantava aipim, batata, essas coisinhas, cará pra fazer o pão. Fazia o pão só em dia de aniversário, de trigo né. Era só o pão de milho naquela época.” Ela relembra que pão de trigo, assim como outras “misturas” eram apenas para ocasiões especiais: “Não era de fazer cuca, bolo, fora de época. Época assim que era de aniversário. Às vezes no sábado fazia rosca, mas era difícil”. O trigo não era produzido pelos colonos da região e era caro e difícil de conseguir nas comunidades mais isoladas, mas ela conta que “Sempre tinha carne de porco, galinha a gente produzia tudo, não comprava nada”.

            No Maracujá a diversão ficava por conta das domingueiras: “Domingueiras na casa dos colonos mesmo. Alguém fazia aniversário, vamos na casa de um, na casa de outro. Tinha um gaiteiro lá que tocava a gaita e animava as festas”. Ela também revela que até seu marido tinha uma gaita velha e tocava um pouco. Foi seu desejo que algum de seus filhos também aprendessem a tocar o instrumento, mas que nenhum dos filhos tinha se interessado, porém ela ressalta que a esperança ainda não morreu, pois ela tem esperanças que o bisneto João Arthur realize o desejo de seu bisavô.

    Seu Lino sempre foi muito ativo politicamente. Ele era do UDN e chegou até mesmo a ser vice-prefeito da cidade de Anitápolis, por seis anos – o mandato naquela época era de seis anos. Nessa época em que ele era vice, ele vivia no centro da cidade de Anitápolis, na casa de sua sobrinha Marlene. Durante esses seis anos, ele nunca tirou férias, trabalhou direto. 

Enquanto o pai trabalhava na prefeitura, quem tomava conta da serraria eram os filhos, que desde cedo tinham aprendido tudo sobre o ofício e administração com o pai. 

As coisas estavam muito bem no Maracujá até que começou a existir uma escassez de madeira. Seu Lino já estava com uma certa idade e não queria ter que ir trabalhar na roça e foi então que uma boa oportunidade de negócio aconteceu. O encontro aconteceu por acaso, seu Lino encontrou com os amigos Adroaldo Cassol e Vilmar Becker, e eles comentaram que os dois tinham um terreno na Fazendo Nova, com muito pinheiro e estavam à procura de um sócio, para realizar a retirada da madeira. 

            Seu Lino fechou o negócio e eles se mudaram para a fazenda nova. Mas a vida por lá também era de muito trabalho. “Era tudo casas velha, serraria também não era muito boa e passava lá por dentro da Fazenda Nova. Eu fiquei um tempo no Maracujá, depois eu fui pra lá. Levei umas vacas pra lá, eu tirava leite, fazia um quintal grande, plantava umas coisinhas e outra, criava galinha.”  Os filhos trabalhavam com o pai e ela e sua nora, Terezinha faziam a comida para a família e os empregados. 

            Dessa época ela relembra com saudade de quando os netos Diogo e Thiago eram pequenos: “era uma alegria, eu ia com eles olhar o campo pra olhar o gado, eles brincavam, brincavam muito. O Thiago era mais agarrado comigo e o Diogo com o falecido, né? Com o Lino”.

Com a doença de Seu Lino eles resolveram se mudar para o centro de Alfredo Wagner, em um terreno pertinho da casa do filho Valdeni.

Seu Lino acabou falecendo no ano de 2010, mas deixou um grande legado. Hoje os filhos continuam trabalhando com madeira: Dalmo: Madeireira Pai e Filhos, Valdeni: Madeireira Casa Nova, Waldir: WD Comércio de Madeiras, Orli: Neuhaus Comércio de Madeiras e Claudinei: Madehaus Comércio de Madeirase. Dona Elli se orgulha de falar da grande família que formaram “Ah, já dá mais de 53! Família toda unida né, gosto e amo todos eles igual e eu acho, pelo que eu sinto, que eles todos gostam de mim, né?”

            Ela é a Mota de todos e é isso mesmo, pois Mota significa mãe e ela é uma grande mãe para toda a família Neuhaus.












Postar um comentário

0 Comentários