Budapeste, para mim, começou nas páginas de um livro. Não era uma obra qualquer, mas o romance de Chico Buarque, que me fez ver a cidade como um labirinto de sentimentos, como se eu também estivesse aprisionada entre suas pontes, ruas e divisões. Há algo de mágico e ao mesmo tempo exaustivo em uma cidade que parece dividir-se entre o moderno e o antigo, o prazer e o sacrifício, a calmaria do Danúbio e a intensidade de suas histórias.
Minha primeira imagem de Budapeste foi uma foto quase imaginária, tirada ao caminhar em direção ao Fisherman's Bastion. A cidade se revelou ali, naqueles pontos altos de uma paisagem tão imponente que parecia saída de uma tela, quase intocada pela passagem do tempo. O Fisherman’s Bastion, com suas torres de contos de fada, era como um pedaço de Game of Thrones tirado diretamente da história medieval da cidade. E a vista do Parlamento… Ah, a vista! Não há como descrever sem dar a sensação de que estávamos, eu e o mundo, em um cenário digno de realeza.
Passei por outros cantos da cidade, e as impressões se misturaram como um borrão de tinta. O City Park, por exemplo, guardava um castelo que, embora encantador, me deixou com uma sensação estranha de que ele não era tão antigo quanto tentava parecer. Um castelo "fake", como eu o chamaria, construído para comemorar um aniversário, e não nas pedras de tempos medievais. Mas, quem se importa com isso quando se está rodeado por um rink de patinação gigantesco e águas termais que parecem ter sido extraídas diretamente da alma da cidade?
E o Szimpla Kert, então? Ah, aquele pub alternativo foi uma das experiências mais inusitadas da viagem. Esdrúxulo e maravilhoso, um lugar onde o tempo parecia passar de uma maneira muito diferente da normal. Ali, cada canto contava uma história própria e, ao mesmo tempo, fazia parte de um todo que representava a Budapeste contemporânea, que contrasta de forma tão vívida com sua história antiga e com suas margens banhadas pelo Danúbio. E a cereja do bolo? Fumar narguilé dentro de uma banheira – sim, dentro de uma banheira, no meio do bar. Era um daqueles momentos em que o lugar parecia não seguir nenhuma lógica, mas ainda assim fazia todo sentido. Como uma pintura surreal, onde a fumaça do narguilé se misturava com o ambiente vibrante e único do Szimpla, tornando a noite ainda mais inesquecível. Ali, de repente, tudo era possível.
E a gastronomia, claro, também foi um capítulo à parte. Entre os sabores típicos da Hungria, como o gulyás (o famoso e reconfortante guisado), e os doces que me fizeram questionar se existia alguma dieta no país, Budapeste se revelou uma verdadeira festa para o paladar. Mas, como a viagem foi marcada por surpresas, em um dos dias, me vi experimentando sushi em um restaurante que parecia ter saído de Tóquio, não de Budapeste. Entre uma fatia de peixe e outra, eu ria sozinha, pensando no quanto o mundo ficou pequeno, e como a cidade, com sua mistura de culturas, nos oferece não só o sabor do local, mas também um pedacinho de qualquer lugar que a gente deseje.
Budapeste, assim, me seduziu com sua complexidade. Uma cidade que, como o romance de Chico Buarque, se revela em camadas, entre linguagens e paisagens, e que tem o poder de conectar passado e presente, o palpável e o intangível. Eu me vi, em cada esquina, não apenas na cidade, mas na minha própria viagem interior. E o mais surpreendente de tudo isso? Eu ainda não consegui entender se Budapeste me deixou exaurida ou mais viva.
0 Comentários