15º DIA DE QUARENTENA


Estou entrando em meu 15º dia de quarentena e acho que já estou bem afetada.
Eu morava em um lugar com outras 97 pessoas, uma acomodação estudantil da Mary Immaculate College, mas hoje estou vivendo aqui apenas com mais 6 pessoas, e estamos tentando nos manter isoladas uma das outras. Me mudei provisoriamente para um novo quarto, em um corredor só para mim. - Sim, eu tenho medo de ir ao banheiro à noite, é óbvio.
Divido boa parte dos meus dias entre ler os artigos da pós-graduação e passar raiva na frente do computador lendo os absurdos e asneiras ditos por um certo político e propagado por outras tantas pessoas, que ainda não entenderam que se voltarmos para a rua agora, em duas semanas seremos obrigados a ficar em casa e ainda estaremos chorando pelos nossos entes queridos mortos. 
Nesse período de quarentena fico também tentando não começar a escrever um novo livro, pois seria um caminho sem volta e eu preciso estudar.
Como tenho muito tempo livre fico também fazendo uma profunda análise para entender qual é a de São Pedro ou a de Saint Patrick que resolveram que não vai mais chover na Irlanda. Sério, a única certeza que eu tinha aqui era a de que iria chover, em algum momento do dia iria chover… mas hoje… até essa certeza me foi tirada e eu que estava tão saudosa do sol, agora que ele está aqui comigo, posso vê-lo apenas pela janela. Fico fazendo tudo isso tomando chá, já que estou há 8 dias sem beber coca-cola. 
A primavera chegou no hemisfério norte, mas com ela não vieram apenas flores, veio também o vírus… vírus que levou para outros continentes boa parte das pessoas que eu amava aqui. Vírus que está começando a me deixar apavorada. Apavorada por pensar que nós brasileiros estamos entrando nessa terrível tempestade com alguém tão despreparado guiando nosso barco. 
Essa constatação me faz lembrar que na última semana o presidente aqui da Irlanda fez um pronunciamento, que mais parecia uma luz, parecia um abraço para quem estava desesperado, ele afirmou que o estado - como todo estado tem a obrigação de fazer - fará sua função, a de ajudar seu povo perante a crise e finalizou o discurso com a frase: “Vamos ficar juntos como uma nação, mas separados uns dos outros” e era esse o discurso que todo líder responsável deveria estar adotando.
Como eu já disse, a primavera chegou... mas parece que estamos no outono, com tudo morrendo e uma tristeza misturada com melancolia pairando no ar. 

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