Estima-se que até quarenta e sete milhões de pessoas tenham morrido durante a Segunda Grande Guerra. Com certeza é uma página terrível de nossa recente história. Como sabemos não houve combate dentro do território brasileiro, mas o Brasil participou da guerra enviando cerca de 25 mil soldados – os pracinhas - para lutarem ao lado dos aliados norte-americanos contra efetivos de soldados alemães, em território italiano.
Desses 25 mil soldados, 443 morreram durante os combates, entre os mortos, o nosso Roque.
Os pracinhas mortos foram enterrados no cemitério da cidade de Pistoia, na região da Toscana, na Itália e as famílias brasileiras foram avisadas por meio de telegramas e posteriormente recebiam uma medalha de honra.
A história do Roque – Pedro Laurindo Filho - podia nunca ter sido conhecida, ele poderia apenas figurar como mais um soldado do interior de Santa Catarina que encontrou seu fim em um lugar frio e distante de casa. Ele poderia ser só a história que os filhos da Dona Anna e do Seu Juquinha ouviram muitas vezes enquanto eram crianças:
“Minha mãe Anna ainda mocinha morava em Major Gercino.
Ela tinha uma tia analfabeta chamada Gina e um primo chamado Pedro Laurindo Filho. Para tristeza de toda a família o Pedro, para nós Roque, semianalfabeto foi convocado para lutar na Segunda Guerra mundial. Sem outra saída ele se apresentou com apenas 23 anos.
Ele era apenas um agricultor jovem e apaixonado.
Pois bem, o Roque foi pra Itália e na primeira batalha já perdeu sua vida.
Meu avô materno único que sabia ler, recebeu o telegrama e uma medalha agradecendo com pesar e alertando a família que o Roque morreu como um verdadeiro herói brasileiro. Meu avô chorava muito e teve que ler o telegrama para cunhada, mãe do Roque, tia Gina.” (Valda da Cunha Fujii)
Como uma mãe poderia aceitar que um filho morrera lutando em uma guerra que não era dele? A família inteira ficou muito abalada por essa tragédia.
O pobre Roque nem sabia direito pelo que estava lutando. Não tinha razões para matar os alemães, mas estava lá segurando uma arma, no lugar de sua enxada. Ele seria mais um jovem brasileiro que morrerá aos 23 anos de forma anônima na Itália?
Esse seria o final da história do Roque, mas ela ganhou um novo capítulo ano passando quando uma outra filha da Dona Anna e do Seu Juquinha, a Valdete da Cunha, encontrou a parte que faltava na história do primo.
Ela encontrou em um livro “Notas de um Expedicionário Médico” de Alípio Corrêa Netto, alguns relatos de médicos que trabalharam na Itália e lá estava registrado o último suspiro do primo.
“No dia 04/12/1944 ocorreram dois acontecimentos que marcaram esta data: um é triste e o outro auspicioso.
O primeiro está ligado ao rapazola operado anteontem. Já perfeitamente bem, sem temperatura pouco elevada, respiração tranquila, embora queixoso de muita dor. Pela manhã sentiu ansiedade respiratória. O enfermeiro nada nos comunicou, uma vez que eram bons o pulso e a pressão arterial. Ao passarmos pela enfermaria, antes mesmo de ir ao refeitório para a primeira refeição, notamos a dispneia do nosso ferido; preocupamo-nos, corremos para providenciar a aspiração traqueal, por parecer-nos certo que o sangue coagulado nos seus brônquios o sufocaria rapidamente. Não houve mais tempo num minuto morria, sereno, suavemente, conservando ainda a fisionomia inocente e meiga de um meninão em repouso. Pedro Laurindo Filho deu sua vida em defesa de um ideal, as suas feições pareciam indiferentes ao supremo sacrifício. O herói tombou desconhecido, o esquecimento pesará sobre seu túmulo.
Um soldado é nada quando a inconformidade leva os povos às lutas fratricidas, mas muitos corações enlutaram-se bem longe da cena dramática e as lágrimas correram também em silêncio.
O outro caso foi o reverso da medalha.”
O outro caso que o livro conta, trata de um soldado que chegou lá sem vida, mas como por um milagre, após já ter recebido atestado de óbito voltou a viver.
Dois casos completamente opostos. A família do soldado americano vibraria, mas a família Laurindo ficaria com uma ferida aberta e demoraria 75 longos anos para saber como de fato terminou a vida de Roque.
Hoje os restos mortais de Roque encontram-se enterrado no Cemitério dedicado aos heróis da Guerra no Rio de Janeiro e a família Cunha continua indo lá. Para orar pelo primo que nunca conheceram, mas que sempre fez parte de sua vida, através da triste história do menino do interior que morreu lutando em uma guerra que não era dele, contada por Dona Anna e que hoje pode ser conhecida por todos.
“Não era pra ele ter morrido, já havia sido medicado e passava bem”.
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